Cada geração é influenciada pela geração anterior e tem o dever de influenciar as gerações seguintes – esta é a expectativa de uma vida em sociedade. A solidariedade intergeracional é mais do que nunca uma demanda, embora, seja mesmo alimentado um sentimento um tanto contraditório, fazendo-nos crer que o desafio que cresce, entre esta e a anterior geração é o da coexistência. Foi isso que nos tentou fazer crer Rui Rio quando nos disse que um filho podia hoje receber mais salário que um pai, desde que esse filho fosse um Juiz e o pai fosse Professor, colocando a tónica errada num “suposto” conflito geracional, que não o é. Na verdade, o desafio é velho e o mesmo de outrora, embora, seja certo, sempre desconhecido dos sucessivos governos PSD/PS: o da valorização do Trabalho.
Ora, é suposto e expectável que se conquistem direitos ao longo dos tempos, e é suposto que estes sirvam as gerações futuras, que lhes melhorem a vida, que lhes deem aquilo que as gerações anteriores não tiveram.
Na verdade, sendo o Trabalho o grande factor/motivo de mudanças sociais que nos permite, por exemplo, falar na existência de novas gerações trabalhistas, como é agora o caso da chamada “geração milénio” (ou em cenários menos optimistas de “geração à rasca”), não podemos continuar a ignorar que se vivem novos desafios, que explicam também um certo novo sentimento de frustração social generalizado entre os mais jovens, sendo que, são a geração mais qualificada (certo é, graças aos sacrifícios e lutas das gerações anteriores) que criaram expectativas num futuro melhor mas, cuja realidade e qualidade do emprego não as acompanhou.
O início da vida profissional cada vez menos é um momento estanque, circunscrito no tempo, a inserção no mercado de trabalho é feita ao longo de anos e anos: repete-se.
Aliás, a consciência de que a vida a qualquer momento pode voltar para trás é uma forte característica consequência do Trabalho do nosso tempo, da nossa geração: saímos da casa dos pais e sabemos que um dia lá voltaremos, saímos da escola mas sabemos que um dia lá voltaremos.
A política pública não tem sido capaz de responder a nenhum destes problemas (nem aos velhos problemas, na verdade), sendo que, pelo contrário, alimenta novas formas voláteis de emprego – o emprego de muito curta duração (que se protela e cada vez mais e perde o caracter excepcional), os estágios pouco ou nada remunerados que são difundidos pelas empresas como grandes oportunidades e, até, a propagação de uma certa nova ideia do “jovem empreendedor” que, agora, empurra para o Trabalhador o ónus da criação e responsabilidade pela criação do seu próprio emprego. Nos últimos anos temos assistido a um crescimento do recurso a formas de trabalho baseadas em plataformas digitais, o “crowdworking” ou “gig work”, que também omitem uma valente regressão social do trabalho, porque são altamente caracterizados pela desregulação dos horários e de uma suposta perda de subordinação (vendido como algo positivo) mas que, na prática, é uma perda de direitos para o trabalhador e desresponsabilização das entidades patronais perante o trabalhador, que amealham, a esse custo, mais lucro.
De acordo com o Relatório do Orçamento do Estado 2020, “tendo em vista aumentar a capacidade de Portugal reter talento, será criado em 2020 um incentivo fiscal dedicado aos jovens qualificados que iniciam a sua vida profissional.” Este alegado incentivo traduz-se na isenção parcial do pagamento do IRS sobre os rendimentos recebidos nos jovens entre os 18 e os 26 anos que não sejam dependentes, mas só e apenas para os jovens cujo rendimento colectável anual seja inferior ou igual a 25.075 euros durante os três primeiros anos. Pelo traço que caracteriza o trabalho actualmente, esta medida de pouco servirá aos jovens que enfrentam problemas profundos de precariedade, para além dos baixos salários, o da estabilidade no emprego. Assim, a esquerda continua sem responder verdadeiramente a este grito comum entre os jovens, que continuarão a viver com “saudades de futuro.”
 
 