Desde o final dos anos 70, os povos vivem debaixo do pesadelo neoliberal, um sistema normativo traduzido na conquista do poder pelas forças neoliberais, no crescimento do capital financeiro global e no surgimento de um novo sujeito, educado no princípio universal da concorrência.
Este modelo é sustentado por oligarquias burocráticas e políticas, multinacionais, actores financeiros e grandes organismos económicos internacionais.
A fase neoliberal de acumulação capitalista prioriza os interesses do capital privado transnacional, particularmente o financeiro, a destruição do sistema produtivo preexistente, tendo como consequência directa a desindustrialização, o desemprego estrutural, e taxas inéditas de exploração do trabalho.
Do ponto de vista ideológico, a racionalidade neoliberal pugna pelo desmantelamento das organizações dos trabalhadores, da legislação laboral e social, a desorganização das esquerdas.
O neoliberalismo, ao contrário do que se pensa, não aposta em menos Estado nem no seu enfraquecimento, porque o Estado constitui uma ajuda, por excelência, para evitar que o capital se auto arruíne no oceano das crises cíclicas e sistémicas.
As reformas neoliberais dependem da ajuda do Estado para desmontar e desqualificar o sistema de acumulação keynesiana-fordista e para regular os salários, controlar o exército de reserva e os efeitos disruptivos da desigualdade social.
Portanto, um Estado Forte, quando não autoritário, é essencial para perpetuar e renovar o actual sistema de acumulação do capital.
O racionalismo neoliberal quer ser visto como uma Nova Razão do Mundo, que não deixa incólume nenhuma esfera da vida social, económica e política.
As ideias e os comportamentos neoliberais estão, sem darmos conta, enraizados nas nossas cabeças e na forma como pensamos e agimos.
Começo por apresentar 6 ideias, entre muitas outras, que sendo conservadoras e neoliberais, são vendidas à sociedade como modernas e fazendo parte de uma Nova Razão do Mundo:
Primeira Ideia – A importância da meritocracia nas sociedades modernas.
Esta ideia procura criar dois polos antagónicos: de um lado os que têm sucesso e do outro os in(sucedidos), aqueles que desistem ou fracassam no sucesso. A ideia de meritocracia mina a solidariedade e a cidadania, aprofundando a competição em vez da cooperação, assim como a concorrência entre as próprias vitimas do capitalismo.
Segunda Ideia – A defesa do individualismo
Esta ideia é apresentada como fazendo parte de uma cultura identitária, mas não é mais que o culto do egoísmo social, da negação da solidariedade e da redistribuição. O individualismo pode desembocar em movimentos reacionários e até neofascistas.
Terceira Ideia – Igualdade de Oportunidades
A racionalidade neoliberal procura convencer-nos que um desempregado, um sem abrigo, a maioria dos assalariados com remunerações miseráveis, os mais de dois milhões que vivem abaixo do limiar de pobreza em Portugal têm as mesmas oportunidades que um indivíduo rico.
Quarta Ideia – A importância da Escola Pública
A defesa da Escola Pública faz parte do imaginário de uma certa direita e esquerda. Não se questionam as ideias, os valores, o modelo económico e social defendido pela Escola Pública. Não se questiona ao serviço de que interesses de classe está o ensino ministrado na Escola Pública.
Quinta Ideia – O superior interesse da Estabilidade
A estabilidade política como uma condição de defesa da democracia é outra das ideias profusamente difundida pela sociedade e profundamente enraizada na superestrutura política. Os orçamentos de Estado, as políticas contrárias aos interesses da maioria das pessoas devem, segundo os defensores da estabilidade, ser aprovados da direita à esquerda, em nome do interesse nacional.
Na verdade, o conceito mecanicista de estabilidade é o oposto da luta de classes, da consciência crítica, da dialética da vida. O conceito de estabilidade pode dar votos, mas o seu objectivo essencial é adormecer a luta dos trabalhadores e desmobilizar as vítimas do sistema capitalista.
Sexta Ideia – As virtualidades da desigualdade social
A ideia de uma certa desigualdade social para a defesa do emprego é-nos vendida periodicamente. Ou seja, tem de haver desemprego, menos impostos para os ricos, salários mais baixos para que os capitalistas possam continuar a investir e a criar postos de trabalho.
Está provado, que muito do valor gerado no processo de produção vai quase inteirinho para a especulação financeira, de forma a compensar o decréscimo tendencial da taxa de lucro. Além do mais, vemos empresas com lucros e até com prejuízos a distribui-los pelos seus acionistas, relegando uma percentagem residual para o investimento produtivo.
Estas e outras ideias não são minimamente questionadas na sociedade portuguesa por aqueles que o deviam fazer.
Na verdade, caminhamos para uma sociedade sem reflexão. Há dias, Marisa Matias, enquanto candidata à Presidência da República, afirmava publicamente que defendia uma economia para TODOS.
Como é possível defender uma economia para todos quando os meios de produção estão nas mãos de uma minoria? E, assim sendo, há os que têm muita economia, e outros muito pouca ou nenhuma.
Não é por acaso, que a ecuménica OXFAM referia no seu último relatório que 2553 indivíduos no mundo possuíam uma riqueza superior a 4600 milhões de pessoas (mais de metade da população mundial).
A esquerda e as esquerdas precisam reflectir com sentido de classe, partindo do princípio que representam aqueles que, há muito, foram expropriados dos seus meios de produção, limitando-se, agora, a produzir mais valor para os actuais proprietários desses meios.
É com esta consciência, que podemos iluminar o caminho dos povos, uni-los e organizá-los para um combate de nível superior.