O Observatório Ibérico de Energia acaba de confirmar a sucessão recente de pelo menos três incidentes recentes na central nuclear de Almaraz, os dois últimos no espaço de apenas de cinco dias.
O jornal espanhol “eldiario.es” refere que na madrugada de sábado, às 03:33 horas, registou-se uma paragem automática não programada no reator da Unidade II, reportada ao Conselho de Segurança Nuclear (CSN), sem consequências para trabalhadores e ambiente. Segundo a direção da central de Almaraz, os técnicos estão a investigar as causas do disparo do interruptor, integrado no sistema de paragem automática, que esteve na origem deste incidente de sábado.
A Associação para a Defesa da Natureza e Recursos da Estremadura manifestou preocupação pelo incidente. O seu dirigente Chema Mazon, membro do Movimento Ibérico Antinuclear, explicou que o comunicado oficial das autoridades espanholas diz que o reator parou por causas desconhecidas. E isso é um problema.
“Estamos muito preocupados com este último incidente e pela nota oficial do conselho de segurança nuclear, que diz que não se sabe muito bem aquilo que aconteceu. A explicação técnica não é muito clara e esperamos explicações das autoridades à sociedade espanhola, mas tratando-se de Almaraz, Portugal e o Governo português devem pedir informações ao governo espanhol”, aconselhou Chema Mazon.
A Associação Zero também quer intervenção do Governo português na central nuclear de Almaraz e teme que esta sucessão de incidentes seja o início de problemas maiores.
“O meu receio é que estes incidentes que, à partida, não tiveram consequências nem para os trabalhadores nem para o ambiente, se venham a acumular de forma repetida e com consequências mais graves porque estamos a falar de uma central nuclear que pode ver o seu período de vida estendido até 47 anos”, explicou à TSF Francisco Ferreira.
A central nuclear devia fechar em 2020, mas o governo espanhol já recebeu uma autorização especial para prolongar a atividade até 2028. Falta ainda uma decisão final do governo. A associação ambientalista Zero contesta a decisão de permitir o prolongamento da vida útil da central nuclear, defende que o Governo português tem de ter uma palavra a dizer e que o executivo espanhol deve ter em conta estes incidentes na decisão que vai tomar. As empresas proprietárias de Almaraz querem renovar a licença de exploração por mais 7,4 anos (2027) para o reator I da central e de 8,2 anos (2028) para o II.
“É evidente que podemos ter circunstâncias, nomeadamente de segurança, que levem o Governo espanhol a mudar aquilo que o centro de segurança nuclear decidiu agora, há cerca de dois meses. Mas também é importante, da parte do Governo português, não baixar os braços em relação à central de Almaraz”, afirmou o responsável da Zero.
No momento do incidente ocorrido na madrugada de sábado, a Unidade I de Almaraz estava em processo de carregamento, com 51% de energia e, segundo a informação dos proprietários da central ao CSN, não se registaram impactos nos trabalhadores ou no meio ambiente.
Em operação desde 1981, o prazo inicial de operação já foi ultrapassado, mas os proprietários (Iberdrola, Endesa e Naturgy) requereram o prolongamento do seu funcionamento. A sucessão de incidentes pode ser um sintoma do envelhecimento da instalação que tem dois reatores nucleares. A central está implantada numa zona de risco sísmico, perto da fronteira portuguesa e junto ao Rio Tejo.
O Governo português não tem reagido junto do Governo espanhol face à instabilidade e perigosidade de Almaraz, ou tem-no feito de forma tímida, apesar de já ter reconhecido que as autoridades espanholas resistem a fornecer toda a informação sobre o que se passa na central. No caso da instalação do depósito de resíduos nucleares (ATI – armazém temporário individualizado) junto à central e ao Rio Tejo, em 2018, cuja construção chegou a ser contestada pelo governo português, foi apresentada uma queixa à Comissão Europeia contra Espanha, sendo retirada após um parecer da Agência Portuguesa para o Ambiente.