A proposta 680/2020 apresentada na reunião da Câmara Municipal de Lisboa (CML) do passado dia 12 de novembro, subscrita pelo vereador Ricardo Veludo, responsável pelo pelouro do Urbanismo, foi aprovada com os votos a favor do PS, PSD e CDS e a abstenção do BE. Apenas teve os votos contra do PCP.
Tratou-se da aprovação do projeto de arquitetura de obras de alterações com ampliação para os imóveis do quarteirão delimitado pela Praça da Figueira, Rua do Amparo, Rua da Betesga e Praça D. Pedro IV, conhecido pelo “quarteirão da Suíça”, designação que lhe é dada por ter sido naquele local, esquina com a Rua do Amparo, que esteve instalada desde 1922 a Pastelaria Suíça.
O projeto aprovado foi submetido à CML pela empresa JCKL Portugal – Investimentos Imobiliários Lda, representante da imobiliária espanhola Mabel Capital, na qualidade de proprietária daquele conjunto composto por quatro imóveis com frentes para o Rossio e Praça da Figueira, adquiridos em 2018 à Sociedade Hoteleira Seoane por 68 milhões de euros.
A Seoane chegou a ter um projeto aprovado em 2009 para aquele quarteirão, um hotel de 5 estrelas com 106 quartos, mas que foi contestado pelo movimento Cidadãos por Lisboa (CPL) através da vereadora Helena Roseta por aumentar a pressão turística e excluir habitação, e que acabou por não ser concretizado.
O projeto agora aprovado pela CML para o “quarteirão da Suíça” preconiza que os cerca de 10.000 m2 em superfície de pavimento sejam para a instalação de quatro unidades comerciais e de uma unidade de serviços no piso em sótão, sem qualquer área dedicada a habitação.
Com a aprovação desta operação urbanística de reabilitação, considerada “uma intervenção com impacte relevante e/ou semelhante a uma operação de loteamento”, o PS não cumpre o acordo estabelecido para o Executivo municipal entre o BE e o PS, na sequência das eleições autárquicas de 2017, que prevê, no ponto F-1 d), uma “percentagem mínima de 25% do edificado, nas novas construções ou operações de reabilitação, destinada a habitação a custos controlados.”
A função habitacional ficou completamente excluída do projeto para o “quarteirão da Suíça”, apesar de o Plano de Pormenor de Salvaguarda da Baixa Pombalina (PPSBP) indicar que “os pisos superiores destinam-se, preferencialmente, ao uso habitacional e serviços” (nº 2, art.º 17º do PPSBP). A proposta do promotor aprovada pela CML não tem qualquer preocupação com a função habitacional, essencial para uma real regeneração e requalificação urbanas da Baixa e para o desenho de uma cidade vivida quotidianamente pelos seus moradores, multifuncional e não gentrificada.
São apenas os grandes interesses imobiliários e especulativos que presidem à proposta da imobiliária JCKL que, deste modo, concentra a operação numa nova grande superfície comercial na expetativa da obtenção e otimização de lucros mais elevados. A CML, através de instrumento de gestão territorial, como o PPSBP, ou de um caderno de encargos com contrapartidas negociadas com o promotor, tinha a obrigação, em nome do interesse público, de garantir que o projeto para o “quarteirão da Suíça” contribuísse para o aumento da oferta de habitação, combatesse o despovoamento do centro histórico, apoiasse a instalação de comércio tradicional e ajudasse à revitalização do conjunto histórico da Baixa Pombalina, incluída em Área de Reabilitação Urbana.
A esquerda não se pode demitir do combate pela cidade democrática em vez da cidade ao serviço do mercado e da especulação imobiliária, ainda para mais quando há um acordo político que é também um compromisso com os munícipes que tem de ser cumprido e que estabelece um compromisso sobre matérias urbanísticas que são gravemente alienadas no projeto aprovado.
É um combate difícil, de facto, mas que é central para uma proposta de esquerda alternativa, democrática, anti neoliberal e pelo direito à cidade. Desde logo assumindo os seus compromissos e exigindo que os compromissos políticos do PS, como condição de sustentabilidade maioritária do Executivo municipal, também sejam respeitados.
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