A Mesa Nacional do Bloco de Esquerda reúne este domingo para tomar uma decisão sobre o sentido de voto relativamente à proposta de Orçamento de Estado para 2021, na generalidade, apresentada pelo Governo.
Apesar de em contexto diferenciado, trata-se de uma proposta de OE na continuidade da anterior, naquilo que podia ser decisivamente diferente em termos da pressão para baixar o défice imposto pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento da UE, suspenso este ano tendo em conta a necessidade de resposta dos Estados membros à crise pandémica.
A política de austeridade do OE anterior é a linha desta nova proposta, com a agravante de que vai ser preciso responder à carência de meios no SNS que será brutal ao longo do próximo ano – basta perceber o que se está a passar nos Centros de Saúde, ou à perda de rendimentos de milhares de famílias pelo lay-off, aumento do desemprego e da precariedade, com dramáticas consequências no crescimento do desemprego e da austeridade. A necessidade absoluta de recuperação da operacionalidade e qualidade dos serviços públicos não se compadece com as limitações impostas pelo objetivo da diminuição do défice.
Os aumentos salariais serão marginais ou mesmo inexistentes, provocando a queda real dos rendimentos do trabalho. Nada muda de significativo na legislação laboral imposta nos tempos do governo Sócrates e no período da Troika, em particular no que respeita à caducidade unilateral da contratação coletiva e do fim do princípio do tratamento mais favorável, uma das formas mais gravosas da continuidade das políticas de austeridade com consequências na quebra salarial, na pressão para aumento da jornada de trabalho e na desregulação das carreiras profissionais. Esta política, a par da não proibição dos despedimentos, em especial nas empresas com apoios públicos, terá consequências diretas no aumento do desemprego e nas contas públicas.
O investimento público permanece anémico, um dos mais baixos de toda a UE e muito aquém do orçamentado, na continuidade tanto do OE2020 como do Suplementar, numa clara opção pelos critérios neoliberais de Maastricht que condicionam a intervenção pública, prejudicando a criação de emprego e diminuindo a capacidade das infraestruturas e dos serviços públicos essenciais para responder à crise provocada pela pandemia.
O escândalo do Novo Banco continua com a drenagem a prazo de fundos públicos mediante compromissos estabelecidos pelo Fundo de Resolução. Como é típico da austeridade, o capital escapa e até beneficia da crise à custa de fundos públicos. Neste OE são os mesmos de sempre a suportar os custos da crise.
De facto, ao contrário do que refere a propaganda da direita, não se trata de uma proposta de OE própria da esquerda, tal como não foi o anterior. É um OE de continuidade de uma política com evidentes elementos de austeridade que rompe com o esforço de recuperação de rendimentos do trabalho dos primeiros anos da Legislatura anterior.
Perante este quadro, a esquerda não deverá ter condições para viabilizar esta proposta de OE2021. A Mesa Nacional de domingo terá a elevada responsabilidade política de rejeitar a continuidade, com a afirmação de um caminho alternativo em defesa do trabalho, dos serviços e do investimento público, de uma resposta robusta à crise nas diversas áreas que impeça o agravamento da pobreza, das perdas salariais, da morbilidade e das desigualdades económicas e sociais.