Memórias retalhadas da imponente Manifestação da Lisnave após 45 anos

No dia 12 de Setembro de 1974 mais de cinco mil trabalhadores dos estaleiros da Lisnave, em Almada, marcharam em direcção a Lisboa para nos juntarmos aos companheiros e camaradas dos estaleiros da Rocha. O objectivo foi a realização de uma manifestação junto ao Ministério do Trabalho, pelo saneamento de gente envolvida, organizada e a agir com a Pide numa rede repressiva sobre os trabalhadores. Esta manifestação foi também contra a Lei da greve e da Requisição civil dos grevistas, arma usada pelo governo Provisório, composto por forças, tais como: PS, PCP e PPD.
Logo pela manhã, entraram três oficiais do MFA, destacados para tentarem impedir a mobilização, organização e realização da Manifestação dos Trabalhadores da Lisnave pelo Saneamento e pela Liberdade incondicional de fazer Greve.
Pelas 15.00 horas realizámos uma Assembleia em frente ao Refeitório Central. Aí foram realizadas várias intervenções, na sua maioria pela Manifestação, mas também contra, e contou, principalmente, pela alocução de um Major que nos tentou desmobilizar, mas sem êxito, já que foi brindado com vaias.

Durante o dia também fomos brindados com comunicados do PS e do PCP, partidos do governo, a atacar a realização da Manifestação. Mas a determinação era forte para enfrentar o cerco montado pelas tropas do COPCON. O morro em frente do Estaleiro com fuzileiros de arma em punho, estrada cortada pelos fuzileiros, carros e uma chaimite completavam a intimidação.

Manifestação de 12 Setembro 1974 dos operários da Lisnave à saída do estaleiro
Pelas 17:00 horas começámos a formar em filas de sete, braços dados e perfilados à distância do braço estendido. As faixas de pano, com as exigências políticas e outras reivindicações, são hasteadas. Ao toque da sirene, que marca as 17,20 horas, iniciámos a marcha deixando para trás os primeiros militares.
Eis que duzentos metros à frente, junto do Canecão [Cacilhas], novo bloqueio da estrada pelos fuzileiros, de armas apontadas para este exército de proletários. A nossa revolta é grande misturada com persuasão apontada aos soldados. Disparámos palavras de ordem, tais como:
– “Os Soldados são filhos dos operários!”
– “Os soldados já foram operários!”

– “As armas dos soldados não se voltam contra os operários!”

Manifestação 12 Setembro 1974: operários aguardam no cais de embarque em Cacilhas o barco para Lisboa
Marchando alinhados, passada cadenciada e gritando ao ritmo da cadência, este exército proletário mexeu com os soldados que, passados alguns minutos, abriram alas para passarmos até aos Barcos/Cacilheiros rumo ao Cais do Sodré, onde nos fomos juntar com outros proletários da Lisnave Rocha.
Pelas ruas da Baixa lisboeta, este exército metia respeito na sua imponente organização, cadência de marcha ritmada com palavras de ordem. A nós juntaram-se outros proletários da TAP, CTT, ENI, Gaslimpo, Jornal do Comércio, EFACEC e povo sedento de justiça e de uma vida sem peias para as suas famílias.

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