Evo Morales, presidente da Bolívia, anunciou este domingo que renuncia à presidência após as Forças Armadas “sugerirem” que ele deixasse o cargo. Um autêntico ultimato que não é mais do que um golpe dos militares contra o poder constitucional.
“Houve um golpe cívico, político e policial. O meu pecado é ser indígena, líder sindical e plantador de coca”, disse Morales, ao comunicar a sua decisão numa intervenção na televisão ao lado do seu vice-presidente, Álvaro García Linera, e de Gabriela Montaño, ministra da Saúde e ex-presidente do Senado.
Morales justificou sua renúncia para evitar a continuação da violência no país após três semanas de confrontos nas ruas. “A vida não acaba aqui, a luta continua”, disse ele no final de seu discurso.
Na sequência de um relatório da Organização dos Estados Americanos (OEA) sobre as recentes eleições presidenciais, Evo Morales tinha anunciado a repetição do ato eleitoral e a renovação de todos os membros do Supremo Tribunal Eleitoral (STE) criticados pela forma como foi conduzido o processo de contagem dos votos.
Pouco tempo depois, o comandante das Forças Armadas da Bolívia, general Williams Kaliman, divulgou um comunicado em nome do alto comando em que “sugeria” a saída de Morales, numa clara atitude ameaçadora de uma ação militar contra o governo constitucional boliviano.
“Forças obscuras destruíram a democracia”, disse Evo Morales no discurso de demissão. “A luta não acaba aqui. Os humildes, os pobres, os sectores sociais, vamos continuar esta luta pela igualdade e a paz”, declarou o presidente demissionário.
Independentemente da existência de movimentações internas e externas interessadas em desestabilizar toda a América Latina provocando e explorando o descontentamento popular, vi na cedência de Morales à repetição das eleições, um sinal de que não tinha condições de contestar objectivamente a acusação de fraude.
Se não tinha dúvidas quanto à lisura do processo e havia uma explicação para a súbita reviravolta dos resultados, então teria sido preferível não abdicar da vitória que lhe pertencia, obrigando os militares a assumir perante o mundo que estavam a dar um golpe inconstitucional.