COVID-19: lições de hoje e para amanhã

O fenómeno COVID-19 vem tornar clara a fragilidade estrutural do Serviço Nacional de Saúde e, em simultâneo, evidenciar o papel fundamental dos seus profissionais na manutenção da capacidade de resposta, numa verdadeira entrega à causa, muito além das exigências éticas e deontológicas de cada um/a.

A escassez de recursos humanos e técnicos tem vindo a ser exposta ao longo do tempo, tornando-se alvo de maior preocupação e atenção por parte dos meios de comunicação social e da população, sobretudo em períodos de contingência. O caso da gripe sazonal é um exemplo incontornável dessa escassez. As medidas de contenção são determinantes para um controlo epidemiológico, independentemente do agente em causa. Hoje, tal é matéria inclusa no discurso comum, mas confinado à pandemia decretada. Porém, existem outros agentes que merecem apreensão, designadamente as bactérias multirresistentes que persistem nas unidades de saúde, com impacto significativo nas comorbilidades e prolongamento do internamento hospitalar.

Com o COVID-19 têm sido exigidas medidas simples, mas deveras eficazes na minimização da disseminação viral, numa prática de informação contínua, simplificada e pedagogicamente central na educação das populações. A higienização das mãos ou a correcta etiqueta respiratória consubstanciam duas medidas essenciais para a diminuição da propagação de agentes patogénicos, cujos efeitos se revelam particularmente nefastos, por vezes fatais, nos designados grupos de risco. Duas prácticas que deverão permanecer ao longo do tempo e ser assumidas por todas e todos como rotinas de higiene, prevenção da saúde e acto cívico substanciais.

A utilização adequada dos serviços de saúde configura também uma das maiores exigências de reflexão num futuro próximo, sendo central a oferta de serviços de saúde de proximidade que configurem o contacto primordial das cidadãs e cidadãos, evitando o acesso às urgências hospitalares por queixas comuns, facilmente tratáveis em sede de cuidados de saúde primários e/ou no domicílio.

Finda a circunstância actual, é premente dar o salto qualitativo nas políticas de saúde e de educação para a saúde, capacitando as/os utentes para assumir um papel activo nos seus projectos de saúde, informados sobre medidas protectoras e incrementadoras da sua qualidade de vida.

A literacia em saúde deve ser uma prioridade política a curto, médio e longo prazo – muito além da acção reactiva em curso. O espaço público deve ser utilizado como recurso à educação para a saúde, promotor de projetos positivos de saúde, centrados na prevenção da doença e promoção da saúde, ao invés de um sistema essencialmente, ainda, montado para resposta secundária e terciária.

Importa ainda salientar a urgência de colmatar as falhas existentes nos serviços hospitalares que configuram focos de infecção há muito identificados, mas que tardam em ver adoptadas acções para a sua mitigação ou eliminação. São exemplos a garantia da distância entre camas nos distintos serviços hospitalares, incluindo unidades de cuidados intensivos, independentemente da idade dos doentes.

Não é aceitável, nos dias de hoje e com o conhecimento detido e difundido pela comunidade científica, que o Serviço Nacional de Saúde continue a ter unidades onde as medidas de isolamento de contacto e/ou gotículas não podem ser cumpridas a 100%, seja pela ausência de equipamento de protecção individual, seja pelos materiais das bancadas de trabalho dos serviços (madeira e superfícies não íntegras, por exemplo), ou pela discrepância inter e intra-hospitalares de protocolos de desinfecção de unidades pós transferência e/ou alta de doente infectado. Urge exigir todas as medidas que aumentem a segurança do doente, que evitem a disseminação dos agentes infeciosos, nomeadamente os multirresistentes, e que protejam os profissionais de saúde que diariamente prestam cuidados.

O investimento em saúde, nas suas instituições públicas e nos seus profissionais, deve ser, finalmente, prioridade. Ao invés de canalizarem milhões de euros no Novo Banco, injectem-no no Serviço Nacional de Saúde. Nenhum milhão entregue à banca salva vidas!

O momento em curso é ímpar oportunidade para a mudança do paradigma vigente. Desperdiçá-lo, é pôr em causa o futuro.

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