Bolsonaro aceita cedência da base espacial brasileira de Alcântara aos EUA e coloca em causa direitos ancestrais das comunidades quilombolas

Jair Bolsonaro e Donald Trump assinaram um acordo que cede aos EUA a soberania territorial brasileira sobre o Centro Espacial de Alcântara, no estado do Maranhão (nordeste brasileiro), infraestrutura estratégica para lançamentos espaciais. A administração Trump passa a poder intervir naquele Centro Espacial de acordo com os interesses aeroespaciais norte americanos, nomeadamente para o lançamento de satélites, naves espaciais, etc. O acordo também coloca em causa direitos históricos das comunidades quilombolas[i] sobre os seus territórios.

Depois da recente visita de Bolsonaro a Washington, onde foi firmado o chamado “Acordo de Salvaguardas Tecnológicas”, a  Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional federal aprovou o acordo com toda a celeridade (21 votos a favor e 6 contra) em finais de Agosto. Agora, o presidente brasileiro quer que a Câmara de Deputados vote em regime de urgência a cedência da base espacial de Alcântara, tendo em conta o interesse dos EUA nas vantagens  tanto em termos de ângulo de lançamento como de economia de combustível.

Jovens de uma comunidade quilombola (Brasil)

Centenas de famílias das comunidades quilombolas que vivem na região, estão ameaçadas de expulsão dos seus territórios. Membros brasileiros do Movimento de Afetados pelo Centro de Lançamento Espacial de Alcântara (MABE), Sindicato dos Trabalhadores Rurais na Agricultura Familiar (STTR), Movimento das Mulheres Trabalhadoras (MOMTRA) no Brasil e outras instituições, dirigiram uma carta aos representantes do Congresso e Senado dos Estados Unidos denunciando e alertando os parlamentares para as “possíveis e graves violações históricas dos direitos humanos contra descendentes dos quilombolas, comunidades de Alcântara, Maranhão”  resultantes do acordo Brasil/EUA para a expansão do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA) nos territórios das comunidades quilombolas locais.

Na carta dirigida aos parlamentares norte americanos, é referido que “as primeiras violações dos direitos dos quilombolas em Alcântara datam da década de 1980.”  O governo expropriou para a construção do CLA uma área de 52.000 hectares, correspondendo a 46% do município. Mais de 2.000 famílias descendentes de quilombos foram afetadas. Em 1991, foram expropriados mais 10.000 hectares e expulsas mais 312 famílias.

No Brasil, o procedimento apropriado para a realização de trabalhos na escala do CLA exige um estudo de Avaliação de iImpacte Ambiental e que seja fornecido consentimento e consulta gratuitos e informados às comunidades afetadas pelo projeto. Infelizmente, o governo brasileiro desrespeitou esses direitos.

Este histórico faz temer o pior em relação às comunidades quilombolas e à forma como Bolsonaro vai querer executar este projeto. A denúncia internacional deste acordo Brasil/EUA e a mobilização solidária pelos direitos das comunidades quilombolas é urgente.

_____________________________

[i]  As comunidades quilombolas são grupos étnicos com práticas de resistência, manutenção e reprodução dos seus modos de vida contra a escravidão e outras formas de opressão, com trajetória histórica própria e relações territoriais específicas. A maioria dos habitantes dos quilombos originais eram escravos fugitivos. Os habitantes, atualmente, são seus descendentes. As comunidades são reconhecidas pela Constituição Federal de 1988 como bens de natureza intangível e parte do património cultural brasileiro.

Deixe um comentário